quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Oráculo

Descobri que escrever é puro narcisismo. Quando se escreve feliz é para alguém achar bonito, quando se escreve triste é para curar a dor dentro do peito. As pessoas dizem que sempre escrevem o que sentem, ora essa, se escrevessem o que sentem teria menos solitários no mundo e mais gente de mãos dadas andando pelas ruas. A verdade é que cansei de ser uma poeta fracassada pelo meu próprio narcisismo e fingir que sou feliz com isso. Ora essa, por mim que esse mundo insano e metódico se exploda hoje mesmo.
As pessoas não valem nem mesmo a roupa que vestem, quem dirá meu talento para amá-las.

A verdade é que cansei, e não tenho motivos para estar cansada.

Acho que todo pseudo poeta tem que saber quando é o seu fim.



quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Enquanto isso, do lado direito do peito...




Ela era só mais uma dessas meninas que queria o ingresso mas não se esforçava para ir ao show. Totalmente desligada e totalmente oportunista. Ora essa, não é pra isso que as mulheres sugam a vitalidade de nós homens? Oportunidades. Elas só criam oportunidades. De serem mais desejadas, mais atendidas, mais seguras de si.  E no final resta apenas um rapaz feito de idiota e que sai por aí, rasgando a roupa da primeira menina que encontra pela frente.

Assim é que saímos como os galinhas, os filhos da puta que só sabem comer as meninas e deixar elas desnudas moralmente pela sociedade. Posso ser um rapaz bem idiota as vezes, as vezes sempre, posso até te fazer de otária pra poder tirar seu sutiã e depois te mandar ir comprar meu cigarro enquanto tomo banho e tiro seu perfume da minha pele suada... Mas eu nunca mentiria pra uma menina.

As mulheres tem disso, não é? Se pintam de coitadas e inventam mil desculpas para sair da situação ilesa. Nós homens damos a cara a tapa, viramos a outra face e não precisamos fingir que nossa consciência está limpa. Minha consciência é tão limpa que eu poderia te dar um banho com ela. O problema de achar a menina perfeita é que todas elas se fazem de perfeita, e na realidade, se perfeição existisse, eu poderia muito bem casar comigo.

Sou o cara perfeito. Odeio cobranças e odeio sentimentos. Quem me lê acha que sou arrogante e que subestimo a inteligencia das pessoas. Ora essa, quem é que não tem sentimentos? Pois lhe digo, sentimento é algo tão descartável que ele nasce e vai embora junto com a fumaça que sai do carro de cada menina que sai da minha casa. Talvez eu até tenha sentimentos, mas prefiro esquecer. Pra lidar com sentimentos, primeiro é preciso lidar com as pessoas, e as pessoas não são confiáveis. Eu nunca vou me achar confiável, pego me traindo toda hora.

Deve ser esse o motivo que faça eu não casar comigo.

Ainda bem.

Nenhum homem perfeito vale a graça de uma mulher oportunista.

sábado, 24 de novembro de 2012

Pequeninice




Sou um rapaz pequeno. E dizem que no meu coração não cabe muita coisa.

Pois digo que sou mesmo um rapaz pequeno, mas no meu coração cabe tanta coisa, que parece não ter espaço para nada.

Não é todo dia que lembro de alguém ou sinto saudades. Se sinto saudades de você por um dia, aproveite! Meu coração é mundano, e as pessoas fazem disso uma pequeninice. Ora, me deixa gostar de você por um dia e voltar a te amar daqui um ano. Não dá para lembrar de todo mundo todos os dias, é muita gente para um rapaz tão pequeno.

Uma vez me falaram: "Você é um rapaz muito pequeno, mas sua vontade é maior que o universo inteiro."  Não entendi muito bem o que o senhor quis dizer, diziam que ele era velho e pessoas velhas são sábias, mas na época não tive idade para entender.

Se você não tem idade para entender, explico-lhe: Eu quero tudo. Bom ou ruim, eu vou querer tudo.

Não importa se é de uma vez, se vem aos poucos, se vem roubado ou se preciso pagar, tudo.

E de tanto querer tudo, você deve pensar, acabei não tendo nada. Pois engano seu. Sou um rapaz pequeno e muito feliz, feliz porque tudo o que eu quero, ninguém no mundo vai me fazer parar de querer.

Pode pensar que sou baixinho ou que apenas minha altura é pequena, talvez eu seja um anão, mas engano seu, novamente, sou pequeno sim, mas só porque todas as pessoas sempre dizem ser grandes e no fundo não são equivalentes nem mesmo ao tamanho de seus sonhos.

Sou um rapaz pequeno, mas mudo todos os dias, mudo toda hora e isso me faz ser maior que muita gente de coração pequeno que vaga por aí.

domingo, 11 de novembro de 2012

Voando com os pés na terra



Eu que sempre tive mania de voar, agora permaneço com os pés no chão.

Era sempre lá, no céu, nas alturas vendo as pessoas como formigas transitando pelo chão sujo. Me avisavam que esse complexo de passarinho um dia iria sair da gaiola. Alguns diziam somente que uma de minhas asas ia se quebrar e o medo de levantar voo iria me fazer fincar as garras em algum lugar fixo.
A verdade é que simplesmente parei, como se o sentido de fechar os olhos e imaginar o céu inteiro sendo meu, estivesse sumido.

Não sou Peter Pan, muito menos Mewtwo, e nunca serei Goku. Pra quê voar?

Passei a vida inteira tentando ser um herói que me salvasse de mim mesma, mas não passei de um passarinho com o coração ferido tentando fugir da Terra. É fácil fechar os olhos e imaginar um mundo com dinossauros, robôs e seres intergaláticos. É fácil ir até lá quando se sabe voar. Pular da janela e ir visitar lugares onde essas pessoas com ego inflado que convivemos, jamais pisarão.

Mas não posso forrar uma cama no céu e dizer que lá é meu lugar. Não posso criar uma estante de nuvens e depositar meus melhores livros e filmes. O céu não é lugar para as pessoas. O lugar das pessoas é no chão, comendo a comida que vem da terra suja e dizendo que assim que é saudável.

O problema é que faz algum tempo que abro meus braços e não alcanço voo. Pulo, me machuco, bato asas e caio no piso de concreto. É como se minha mente estivesse nova e meu corpo pedindo sossego. Se não da mais, não insista.

Eu que sempre tive mania de voar, agora permaneço com a imaginação no céus, e meu corpo na Terra. Tá na hora de ser o super herói de mim, quem sabe um dia, não viro um super saiyajin e consiga levantar voo novamente.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Como vai, estranho?



Olá, estranho.

Sei que não gosta de ficar curioso, ou não saber o que está acontecendo a sua volta... Mas venho te observando há tanto tempo. No começo foi por diversão, achei engraçado como você andava e dirigia seu carro com um braço pra fora da janela. Coisa de gente confiante, mas isso é imaginação da minha cabeça. Onde já se viu ter confiança por dirigir com um só braço?!. Deve ser porque não sei dirigir ainda, essas coisas me assustam.

A verdade é que quando te vi a primeira vez estava com um blazer azul marinho e um tênis esportivo. Tão tolo... Nunca mais te vi assim, acho que usou aquela roupa apenas para eu te perceber. Um rapaz tão tolo, e tão confiante.

Deve estar pensando quem é a maluca que esta te vigiando e te mandando essa carta, afinal, quem manda cartas hoje em dia?

Um desses dias, vinte e oito do seis, para ser mais exata, te vi olhar na caixa de correio vazia, suspirar e voltar para casa com um dos seus roupões furados pelo cigarro distraído em sua mão esquerda. Descobri que perdeu sua mulher há pouco tempo, e se sente sozinho mesmo com esse sorriso brilhante cheirando a tabaco que imagino ter.

Não quero aplacar solidão de ninguém e nem dizer que por te vigiar vinte e duas horas ao dia serei a mulher ideal. Sei que não sou. Veja só, temos a mesma idade e nunca fui casada, não por opção, mas por descaso. Todos os homens acham que eu posso oferecer o mundo para eles, como quem entrega sementes de rosa e se torna uma imensa plantação. Não poderia oferecer isso nem mesmo para você, estranho.


Pra ser sincera, estou morrendo, estranho. Peguei uma doença mais rara que esse tal de amor  que tanto dizem por aí. Os médicos falaram que atingiu meu cérebro e irei perder a noção das coisas em poucos dias. Das coisas que ainda não conheço, você é que me fará mais falta, e olha que te conheço muito bem, apesar de tão estranho.


Te vigio há exatos três anos, oito meses, dezessete dias, cinco horas, vinte e três minutos e quarenta e cinco, agora seis, segundos. Muito tempo, não é mesmo? Para mim passa rápido, chego do trabalho e da janela já te vejo deitado no sofá, com um samba canção surrado de tanto ser lavado. Entreguei o jogo, não é mesmo?

Moro em um lugar que da para enxergar metade do seu apartamento. A sala, a cozinha com vasilhas sujas que só são lavadas duas vezes por semana, e seu banheiro. Sei que fica horas se olhando no espelho, arrumando o cabelo e fazendo pose para atrair a moça do duzentos e um que sempre vai na padaria.

Já te vi conversando com ela várias vezes, cabelos longos, vestido florido e bolsa de mão. Pena que ela não te enxergue como eu enxergo. Quem sabe você não deva usar o blazer e os tênis outra vez?

Gostaria de continuar te observando, vendo você tomar cerveja sozinho enquanto fuma um cigarro olhando para o prédio mais alto da quinta avenida. Sei que vai ler essa carta como quem lê uma declaração da menina feia da escola, e talvez eu seja.

Não fique perguntando para si o motivo de nunca ter falado contigo, esta é a última das minhas verdades: A gente nunca pode aprofundar demais no desconhecido, mesmo que ele já faça parte de nós.

Guardei um dos meus melhores lugares, de tanto tempo que gastei te lendo e relendo, estranho. E não é estranho? Agora não terei tempo para te ver chegar.

Quem sabe será preciso partir, para você tentar me notar.

Boa noite, estranho.

(...)                  



quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Temporário



Convenhamos, já fui melhor.

Hoje ninguém aceita um cara careta como eu nas costas. Evito multidões, não sei mais beber destilados e me contento com um filme sobre guerra em um sábado a noite.
Mal criei rugas e já peguei todas as meninas interessantes da minha cidade, e nenhuma foi interessante o suficiente para querer colocar um anel em seu dedo ou uma corrente em meu pescoço.
Mudo de ideia rápido, e isso faz com que meu melhor estado seja o neutro. Nada penso, nada falo, nada sinto.

Poderia alegar que sou triste e sozinho, mas não sou. De todas as pessoas que me relacionei, suguei o melhor, até a última gota, até a pessoa ir embora seca na amargura. Gosto de coletar momentos felizes e guardá-los só para mim, egoísta, mas útil para alguém que não sabe retribuir.

Não sei retribuir, ou apenas não gosto. Sentimentos não são feitos em pares, não há como alguém sentir a mesma coisa e passar para outrem. Nenhuma menina por mais chorosa ou fogosa que estivesse, me fez sentir borboletas no estomago. Uma vez achei que estivesse apaixonado, frio na barriga, mãos suando, sorriso de ponta a ponta... Foi o dia que descobri o tesão e descartei a ideia idealizada de paixão.

Tenho tesão pelas pessoas, poderia facilmente dizer: "eu tesôo você." Tão mais romântico, prático. Não preciso ficar discutindo sobre sentimentos e amor. Com tesão não há duvidas,  se duvida do meu tesão, meu quarto é aberto para quem afronta.

Empolgo fácil, converso muito e mudo de humor mais do que qualquer adolescente que finge ter problemas de bipolaridade por aí. Meu humor muda, mas meu coração não. Tenho um coração fechado que é encoberto pelo meu sorriso de bom moço, meu olhar de vítima e conversas de quem já viveu muito, mas na realidade... Nunca teve muita coisa para viver.

domingo, 9 de setembro de 2012

O homem que vendia o amor



*Olá, meu nome é Pedro e estou há dez anos sem amar.*

Ouvi palmas de todos os presentes na sala. Era uma sala pequena e com muitas cadeiras. Setenta e seis, contei. Qualquer coisa para me distrair naquela sala seria bem vinda, qualquer coisa que não fosse eu e meu falso moralismo. Fui para dar uma palestra de como era bom e libertador viver sem o amor para um grupo de pessoas que não sabiam sequer o que era isso.

Comecei como qualquer político de esquina começaria. Me levantei e fiquei diante de todos olhando fixamente para um ponto inexistente, fingindo estar envolvido com a multidão. Sorriso largo, aparência deslumbrante e um coração cheio de merda. Isso mesmo, merda. Essas merdas que fedem tanto que conseguimos sentir o cheiro de longe e desviamos o caminho. Tudo o que eles queriam eram uma maneira de deixar de depender de outrem, de se entusiasmar com novos gostos e peles. Isso era certo, daria de bandeja para eles. Rostos cheios de esperança, vontade de mudar, corrompidos por uma ideia tão entristecida . Só mostrei que sou um bom exemplo de homem que conseguiu superar uma mulher que não me merecia.

Meu nome é Pedro e sou um pastor de corações. Virei apenas um homem que precisa acreditar que as coisas tem sua ordem e motivo para acontecer, pois é vontade do destino, o senhor de todos os tempos.

Fingir felicidade é a coisa mais fácil do mundo. Vendo meu fingimento para as pessoas que querem recompor o coração. Mas o preço é caro para quem vende mentira.

Minha vontade todos os dias era mandar aquelas pessoas irem embora para pedir perdão aos seus maridos e esposas, fazerem sexo como selvagens para esquecer que houveram brigas.  Aprenderem a parar de choramingar pelos cantos implorando amor a quem não prometeu sequer paixão. Ah, essas pessoas de hoje amam esperando reciprocidade e acham bonito desdenhar o sentimento mais bonito de todos.

Sou um vendedor de almas. Pego todas as pessoas que vem jogar fora o amor, e sem perceberem, elas é que são jogadas no lixo.

Me chamam de Pedro, o pastor de corações, mas pode me chamar de o demônio dos que ainda estão vivos. Um ceifador dos que perdem suas almas na terra, dos que rejeitam um sentimento por, simplesmente, não saber o que fazer com ele.


quarta-feira, 5 de setembro de 2012

E se o "se" existisse?



Gostar é engolir o orgulho. Sentir ele bater na goela e a barriga retorcer para vomitar. Paixão não sai com refluxo, paixão não sai nem engolindo sabão e lavando o estômago quarenta vezes. Essa sensação de mal estar, frio que parece enojar todo o corpo: é só o orgulho não sabendo pra onde ir.

Uma vez ouvi dizer que para conseguirmos algo na vida, principalmente no amor, é necessário bater várias vezes na porta. Tem porta que é trancada a oito, nove, dez chaves. Não da nem para arrombar.

A vida não segue mansa. É como se cada palavra sufocada entre dentes quisesse ir pelo vento arranhar os ouvidos do sujeito. Ela não me ouviria nem que todos os microfones do mundo estivessem ligados na casa dela, no máximo do meu volume.

Não é um comentário sobre amor, paixões certeiras ou saudade acumulada. Só é uma reflexão de alguém que pensava que não tinha nada a perder, e acabou perdendo quase tudo.

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Ser ou deixar de ser, eis a razão



Todo mundo é um só termo. Gosta ou não gosta, oito ou 80, ama ou odeia.
Todos se fazem de interessante para a menina da festa e de desinteressado para a mulher na cama. A lei dos mais fortes, um sempre se encontra em desvantagem e o que sempre buscamos é: Não ser quem vai embora com a interrogação presa na garganta. 

Tenho vinte e zero anos e sempre achei que sabia demais. Sobre mulheres, homens, amigos e lugares. Sei de  nada, nadinha. Sei nem o que comi ontem no almoço se não for dar uma olhada no lixo. Com o tempo fui percebendo que de um só termo, passei a ser meio termo.

Se ta bom, deixa estar. Se ta ruim, nada que não possa piorar. Se tô apaixonado e não tenho chances, pra quê desespero? Indiretas e suor frio descendo pelo pescoço? Me diga, PRA QUÊ?! A maioria das coisas que falo e penso não tem motivos, e é exatamente por isso que as penso.

Cansei de ter motivos para procurar uma razão. As vezes cansa, não é? Porra, talvez tô lá querendo que a guria me ache interessante e ela só quer um pouco de calma na vida. Dizer que vou em festas, sou dono da melhor boate e frequento os melhores países por hobbie, e ela só quer um cara que diga pra ela dormir cedo que amanhã precisa trabalhar.

Já perdi muitos amores da minha vida por acreditar que eu era o amor da vida delas. Não sou um cara interessante, sou só um cara que se esforça pra ser.

Podem não saber disso, mas sou até legal. Não é porque sorrio só de lado e digo que sexo é a melhor coisa do mundo que eu não tenha sentimentos, mas é que apaixonar fode muito e gozamos pouco. Não da pra entender.

Veja bem, não da pra ser interessante e apaixonado ao mesmo tempo. Um dos dois a gente tem que escolher. O problema é saber qual realmente a gente é, correndo o risco de, talvez, nunca querer ser.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Antes que eu vá


Sempre tive a impressão que ela não ficaria. É como se nela eu visse um desses homens que as mulheres vivem reclamando que não ligam de volta. A gente sabe reconhecer pelo olhar, pelas batidas rápidas do peito esquerdo. Tive que me ocupar de manias que antes odiava: jogar baralho com os amigos, beber destilados em casa de desconhecidos e dar uma de sociavelmente sociável. Ela odiava quando eu era sociável. Me dizia coisas como: "Para de querer aparecer pros seus amigos." Mas no fundo eu sabia que ela só não queria que aquelas meninas solitárias enxergassem um pouco de companhia em mim. Ela nunca dizia, mas eu precisava ser só dela.

Então passei a me encher de álcool e solidão. Essas solidões rodeadas de pessoas que textos clichês e redes sociais vivem falando. Mas a solidão clichê não sabe o que é ser sozinho esperando alguém que realmente existe. Alguém que já esteve ali pelos mesmos motivos que você quer que ela volte.  De qualquer modo, passei a virar um homem triste por dentro e de sorrisos cheirando a álcool por fora. 

Foi a pior fase da minha vida. Passei a fumar e criar planos que nunca seriam reais. Planos de viajar e ser só dela para a vida inteira, afinal, com todo o amor que tinha era impossível não voltar para mim. Por amor a gente volta até pro mais negro dos corações. 

Mulheres e sexo por um tempo foi uma distração compensatória, mas me esvaziava a cada tragada de cigarro que eu dava depois de um orgasmo forçado. Sozinho, triste e cantando poesias vazias pela fumaça que saia de minha boca.

De todas as mulheres que já deitei, gozei e esperei, ela foi a que mais me fez infeliz. Infeliz com sua partida e promessas deixadas na cabeceira da cama quando saiu. Hoje sei que meus amigos só me davam apoio moral, que os livros de auto ajuda só foram feitos para aumentar as prateleiras das livrarias e que o amor estraga até o mais alegre dos palhaços.

Não tenho volta, talvez porque ela também não tenha. Deve estar em alguma esquina por aí reclamando do tempo, da preguiça que sempre teve de voltar de sua faculdade até sua casa, achando que esqueceu alguma coisa enquanto andava com a cabeça nas nuvens.

 Talvez seja essa a nossa diferença: enquanto ela me esquece por ser distraída, me distraio só pra ver se a esqueço.


segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Um amor no divã



A questão é que você sempre foi tão incerta, compreende? Dizer que era o fim nunca foi bem o fim, então pensava que só precisava ir lá, tomar seu ar e um pouco de vinho pra pensar melhor e voltar.

Claro, tinha os dias que tomava suas bebidas e acordava na cama de outro. Uma cama maior e com mais travesseiros do que a minha, daqueles que você afunda quando deita e não pensa em mais nada do lado de fora do prédio. Pensava até que o problema eram os meus travesseiros, por isso fui na melhor loja da nossa cidade e comprei tudo o que você queria, só pra te deixar feliz.

Sempre fiz tudo pra te deixar feliz, não fiz? Talvez por isso sempre voltou. Não, não era por mim. Tinha seus romances de duas semanas e festas cheirando a vodca barata, nesses dias, nunca me procurou. Quando me ligava era pra contar como conheceu um dos rapazes mais lindos e bem sucedidos que já encontrou andando por aí, e que seu coração perto dele parecia um tambor em pleno carnaval.

Essa é a hora que finjo ser seu ombro amigo, não é? Tudo bem, um riso forçado e um elogio de como você é linda para justificar o motivo do homem mais incrível do mundo ter ficado apaixonado por você. Eu poderia ser o homem mais incrível do mundo, mas pra você era só uma ligação pós festa e um encontro pra uma café na esquina da sua casa.

Sempre o lugar mais prático pra você, não? Só que eu não sou o cara mais incrível do mundo, e  o que faço é só pra te fazer feliz.

Passo dois dias decidindo uma roupa pra ir tomar o tal café, enquanto você passa dois dias pensando pra casa de quem vai no final de semana. O auge do meu mês é te ver, o auge do teu é conquistar o rapaz da academia que te ensina como evitar dores musculares.

Pensar que alguns anos atrás me dizia que seu sonho era envelhecer comigo e montar uma casinha de sapê no lugar mais afastado da terra. Levo tudo ao pé da letra, se lembra? Como aquela vez que me mandou te dar o mundo inteiro e te fazer feliz para sempre... Ainda tô tentando.

Só que sei, com o tempo você vai encontrar um cara  que vai te fazer feliz sem esforço, sem travesseiros novos e poemas amanhecidos ao lado de sua cama. Nesse dia eu vou sumir, sumir devagarzinho por dentro feito um caracol com medo.

Nunca vou ser esse tal cara incrível que você sempre procura, mas, se não for pedir demais... Só me deixa tentar ser.

sábado, 4 de agosto de 2012

O passarinho feio



 Quando era mais novo morava em uma vila na rua cinquenta e sete, o lugar mais triste para se viver. As árvores recebiam o silêncio da prefeitura e por isso eram secas e desnutridas, como essas crianças que vemos na África hoje em dia. Quase não fazia sol, o clima não era frio e por isso a sensação era de que sempre havia chovido. "Umidade em alta" - dizia os noticiários. Poucas casas, e vizinhos tão ranzinzas que os enxergava em preto e branco.

Minha família morava lá por falta de opção. Meus avós também eram pessoas em preto e branco, mas meus pais nasceram coloridos, e acho que eles também me enxergavam colorido. A única cantoria que se ouvia na rua cinquenta e sete era as do galo do Sr. Arnaldo - meu vizinho do lado esquerdo. Não era uma cantoria feliz. Pibou, tinha perdido uma das pernas em uma dessas brigas de galo de cidadezinhas vizinhas e seu cacarejar aparentava mais um pedido de socorro do que bom dia.

Naquela época não existia televisão, internet ou essas coisas pequenas que as pessoas levam nos bolsos. Sou um homem muito velho e tudo o que tive na minha vida desde criança foi minha imaginação e um pouco de memória na gaveta.

E foi de uma das minhas gavetas mais empoeiradas que me recordei de Volgo, meu passarinho de estimação.

Costumava ser um moleque que andava pelos quatro cantos da cidade e sempre descobria um novo lugar para se distrair. Uma dessas vezes quando percorria o bosque da mansão Peixoto, após ter entrado pelo muro sem ser percebido, me deparei com um passarinho preto jogado sem jeito no portão do jardim. Me aproximei e percebi sua asa quebrada e um pouco de sangue em seu bico. Não era um pássaro bonito, poderia muito bem se tornar protagonista de um desses filmes do Hitchcock sobre aves que matam e assombram toda uma cidade.

Mesmo assim levei para casa. Sabia que os meus pais iriam vir com o discurso de doenças que bichos de rua transmitem, por isso o escondi. Sei que se fosse um gatinho ou um cachorrinho eles me deixariam ficar com Volgo, mas ele era um pássaro feio e tudo que consideravam feio era ignorado.

Não foi difícil consertar sua asa quebrada, pelo contrário, tive aulas de primeiros socorros na escola quando criança e ele era um bom pássaro, quase não tentava fugir.

Depois de meses Volgo fugiu. Cheguei da escola e encontrei sua gaiola aberta e vazia com todo o alpiste que havia deixado naquela manhã. Sempre deixei sua gaiola aberta, nunca tentei segura-lo comigo, não queria que ele fosse um pássaro triste de uma cidade triste. Só que depois de tanto tempo comigo, andando em meu ombro e comendo a comida do pet shop da esquina... pensei que nunca partiria.

Claro que com a gaiola aberta ele dava voltas pela cidade, mas sempre voltava. Quando ele partiu meus pais pensaram que me encontrava em crise de adolescência, uma garota tinha partido meu coração ou coisa do tipo. Foi com Volgo que aprendi a lidar com a liberdade e que soube que o amor só é difícil quando acreditamos que ele nunca vai embora.

Ele era um pássaro feio de uma cidade triste com pessoas em preto e branco, que ocupou um dos lugares mais coloridos do meu coração. Pode ser só uma história de um velho solitário sentado na varanda de sua casa, mas perdi a conta de quantos passarinhos passaram por minha vida e queriam ter a liberdade de Volgo.


Talvez o amor tenha mesmo cheiro de liberdade.

Ou quem sabe, só aquela tal presença de saudade.



segunda-feira, 9 de julho de 2012

Um conto para pessoas que não são felizes


Essa é a história de um rapaz que morreu de tristeza.

O vi andar na rua umas duas ou cinco vezes. Cabeça baixa, passos alinhados e desastrosamente entrelaçados. Achava engraçado a forma que sua blusa social branca se dividia: uma parte dentro da calça e a outra para fora como quem não se importava com aparência. Foi por isso que notei o rapaz que morreu de tristeza.

Não me lembro se era bonito, lembro que sua boca tinha formato de fruta silvestre e seus olhos nunca sabiam ao certo a cor do céu, pois nunca olhava para cima. A primeira vez que o encontrei estava sentada no banco comendo meu sanduíche antes de ir para o trabalho. O rapaz se sentou ao meu lado falando ao telefone.

- De amor ninguém morre, vou tentar me acalmar.

Desligou o telefone e colocou as mãos fechadas no meio das pernas abertas que esmagavam o chão. Naquele momento jogaria meu sanduíche no lixo e daria um abraço de esmagar o coração naquele rapaz que um dia morreria de tristeza. Mas o sanduíche me custara seis horas de trabalho e de amor ninguém morre.

As outras vezes que o vi foram iguais a primeira, exceto pelo telefone apertado entre os dedos. Ele já não existia. O banco era um ponto de ônibus, ônibus que parecia nunca chegar.

Parece bobagem ou exagero, mas o rapaz realmente morreu de tristeza.

Na manhã de sábado, às oito e quarenta e sete o rapaz foi para o banco esperar o 002, o único ônibus que ia para o final da cidade, quase na divisa entre um estado e o outro. Por viver sempre com a cabeça olhando para chão, creio que não tenha visto o ônibus, pois o mesmo parou, deixou pessoas, levou outras e o rapaz continuou estável.

Minutos depois, antes do meu transporte chegar para me levar até o trabalho, o rapaz olhou para mim. Olhou tão bruscamente que não consegui enxerga-lo, apenas notar que seus olhos eram castanhos e quase não havia cílios em suas pálpebras.

- Tem dias que não da pra fugir.

Atordoada minha única resposta foi um olhar, que o fez prosseguir.

- Minha senhora, fique com meu celular. Ligue para quem achar necessário e conte para quem quiser ouvir: Por amor a gente morre.


E antes que eu pudesse entender o que o rapaz com a camisa branca social desarrumada quis dizer, ele se atirou em um carro preto cromado na quinta avenida. Como se soubesse que o carro estivesse à 60km/h e seu destino escrito nos vidros quebrados de frente ao motorista.

Disseram nas manchetes que ele era algo como "maníaco depressivo crônico". Um rapaz que nunca se encaixou na sociedade e que todos os amigos temiam seu final. Eu não era sua amiga, mas sabia que não era depressão. No meu depoimento sobre o caso não coube a palavra "amor" nos jornais, me falaram que ninguém morre por amor.


Tudo bem, deixe todo mundo achar que era por tristeza.


Essa é a história de um rapaz que morreu de tristeza.

Mas no fundo,

é só mais uma história mal feita sobre o amor.

terça-feira, 3 de julho de 2012

Lembrando Domingo


Sou uma pessoa tradicional, que gosta de atitudes tradicionais. Somente mais um cara no mundo que tenta se desligar dos sonhos, colocar um sapato e fixar os pés no chão na hora de ir trabalhar. Há duas semanas não tenho andado tão tradicional. Não me perguntei o porquê, só não estou. Comecei minha rotina da noite passada, rotina que nunca tive, tampouco as duas da madrugada. Descobri o poder do álcool, aposto que você que esta lendo já bebeu várias vezes, mas eu descobri esses dias e não tenho estado sóbrio desde então. Não gosto de beber, mas das coisas que gosto e não gosto essa é a única que me desliga do mundo. Vou até a sacada, 02:14 mostra o relógio que comprei no antiquário da cidade, abro e mexo nos ponteiros para tentar fazer voltar o tempo. Nada acontece. Me inclino na varanda para sentir o vento soprar no meu rosto. Abro os olhos rapidamente, me lembro porque comecei a beber e pego uma dose de Whisky. Lembro de domingo e cambaleando caio de joelhos me perguntando pela primeira vez: Por que? 

-

Era o fim, eu sentia desde o começo que era o fim. Percebi não pelo olhar, ou por alguma frase dita indiferente. Percebi pelos ovos. Fritei um para mim, e outro para ela. Como de costume. Ela havia me dito uma vez que gostava de comer seu café da manhã devagar para ficar mais tempo me observando, sentindo meu cheiro que vinha com a brisa da manhã. Percebi que ela tinha terminado os ovos rápido e fiquei apreensivo da sensação que senti. Pouco depois, me chamou na escada sorrindo de lado e me puxando para o quarto. Será difícil sentir tanta vontade de estar lá dentro como naquela vez. Até aquele momento. Quando fui me trocar, percebi ela sentada na cama olhando para nosso retrato na estante. Não precisei dizer nada, ela sabia que tinha de dizer. Iria embora, não me deu motivo nem razão. Simples assim e saiu pela mesma porta que me fez entrar tão feliz. Sabe quando a gente sente que não vai durar? Eu sabia. Foi esse o motivo de ter deixado ela ir sem dizer: Volte meu amor, volte. Me perdoe se estou sendo frio ou sensível demais, como disse sou tradicional e não sei como sou diante dessa situação. Naquela noite sonhei com ela, sonhei que estava sonhando que perdia ela dentro de outro sonho. Sucessivamente assim, correndo dos meus sonhos. Fui até seu prédio e sem me dar conta perguntei ao porteiro se ela se encontrava. Não. Ele disse que ela havia saído e eu perguntei onde estava, como se ele me levasse ao lugar fora dos meus sonhos que ela havia se escondido. Fiquei louco e bêbado. Comprei a aliança no outro dia. 



- Eu não esperava nada dela, por isso não fazia perguntas intensas como: Por que? Ela não acreditava no amor, e eu acreditar não faria ela sentir. Então fazia assim, sentia por mim e por ela. Porém, estava determinado a convencê-la que o modo que as borboletas batem as asas, seu ritmo e suavidade, era o mesmo que sentia no estômago quando estava com ela. Só via uma risada irônica matar as borboletas dentro de mim. Passei uma semana acordando os vizinhos e mandando pessoas da rua entregarem flores a ela no trabalho. Todos voltavam dizendo que ela não estava. Por um tempo achei que estava sendo ignorado. Por um tempo. Até que consegui entrar no prédio, e ao tocar a campainha 54 vezes, resolvi bater na porta ao lado. Havia se mudado para longe, pois estava sofrendo com uma doença terminal. Sai do prédio segurando meu choro, quando começou a chover tornando tudo mais fácil para mim. Nunca havia parado para pensar nos gestos, e expressões dela até então, quando começou a tudo fazer um pouco de sentido. As nuvens me acompanharam a caminho de qualquer lugar tentando encontra-la. Qualquer lugar, onde ela pudesse ao menos ter estado. 



- Voltamos ao início dessa conversa. Estamos tendo uma conversa não? Pois bem, passei 4 longos dias tentando encontrar qualquer sinal de onde ela se encontrava, mas descobri que com ela era assim. Não podia ir atrás, ela que fazia suas regras mesmo sem querer entrar no jogo. Hoje voltei para casa e encontrei uma carta jogada sem jeito do lado de dentro da porta. Quando o destino pega para surpreender, deve ser para provar que realmente existe. Não era conta de luz ou água. Amassei levemente sobre meu peito e comecei a ler: "-- Já deve saber que não irei voltar. Me desculpe, sei que fiz uma coisa muito errada e não queria te olhar ao perceber que talvez eu não era tão certa para você. Estou com medo, sempre tive medo. Você me fazia ser quem eu sempre quis, sempre esperei. Por isso agia com você como se duvidasse de tantas coisas, você esperava isso de mim. Seria mais fácil. Hoje está chovendo, último dia de chuva para mim e ela esta lavando você dos meus cabelos e da minha mente. Estou afastada do mundo e sinto que estou no 20° andar e irei pular sem você em baixo para me segurar. Não irei pular, mas será como se fosse. Estou indo embora, mas estarei com você para sempre. Eu te amo. Sim, depois de você. Eu sempre acreditei no amor."


-- Lembra que cai de joelhos? Pois então, deitei no chão e dormi. Ela voltou para os meus sonhos, eu acho que irei para casa agora. 



(Baseado na música Remembering Sunday - All Time Low)

http://letras.terra.com.br/all-time-low/1067870/traducao.html

quinta-feira, 28 de junho de 2012

Tranca-afiada


Meus sentimentos são presos em uma cúpula de vidro.

 Me lembro de quando era apenas uma garotinha que vestia as roupas usadas da prima e saia para brincar na rua com seus doze amigos homens. Era uma garota que não tinha nenhuma amiga. Aprendi desde cedo que mulher é esse bicho duvidoso, que arranca os cabelos da sua boneca preferida e diz que ta mais bonita assim. Eu nunca tive boneca, só via essas coisas na escola. 

Na escola eu batia figurinha enquanto a menina mais bonita da sala arrumava seu cabelo e passava maquiagem. Nunca fui a mais bonita da escola, nunca fui a mais bonita de nada, mas eu era muito boa em bater figurinha. Os meninos me adoravam e as meninas me achavam estranha. Eu sempre fui estranha, mas pelo menos não usava césio 137 nos olhos. Onde já se viu, menina de dez anos usar maquiagem? Mulher é exagerada. Eu sempre fui muito homem por dentro, talvez até por fora.

O problema é que tive que crescer. Aprender a ser mulherzinha, e mesmo sendo mulherzinha ainda fui muito homem. Ah, bendita mania feminina e feminista de achar que tudo gira ao seu redor e precisa ser chata para tomar sua posição no mundo. Cara, eu só quero um desenho e um pouco de sossego. 

Aprendi a ser triste com o tempo. Acho que tudo começou quando tive que mudar de casa e minha mãe jogou meus álbuns de figurinha do Pokémon no lixo: - "Pensei que você não gostava mais." Porra, eu sempre disse que ia gostar pra sempre. Mãe não é muito de acreditar em filho, né não? Chorei tanto que ela me comprou uma casa da Barbie. Chorei ainda mais.

Nunca fui uma criança de chorar. Lembro que a primeira vez que chorei na escola foi pra diretora, dizendo que o menino tinha me batido. Ora essa, bateu nada. Ele tinha roubado um dos meus Tazo's e não quis devolver. Ninguém rouba nada de mim, nem mesmo um Tazo repetido. Ele levou suspensão e eu passei três dias rindo da cara dele quando ia dormir. 

Lembro que ia no shopping só para ver as lojas de brinquedo. Nunca comprava nada, sempre ganhei só roupas. Odiava roupas. Meu sonho era ter um game boy e ganhei um tamagotchi. Queria um boneco do Charizard e ganhei uma Barbie do Paraguai. Minha diversão passou a ser assistir Dragon Ball Z na Band Kids. 

Meus sentimentos são fechados em uma cúpula de vidro. Como os brinquedos caros que nunca tive e ficaram expostos na prateleira da loja de brinquedos. Minha infância foi baseada na improvisação. Improvisar que sou menina, improvisar que nada iria me machucar mais do que o álbum do Pokémon jogado no lixo. Cresci com um idealismo masculino, um achismo de que não preciso de muito pra ser feliz. 

O problema é que desde a infância meu coração foi fechado em uma cúpula de vidro, e talvez eu nunca a encontre. 

segunda-feira, 18 de junho de 2012

De todas as coisas que não foram



Quando exatamente comecei a gostar dela?

Acho que foi quando ela disse que nós não iriamos dar certo. Ora essa, não dar certo, isso é coisa que uma menina diga para um homem como eu?

Nesse momento dei meu sorriso malandro que todas as outras dizem que tenho e passei a mão pelo cabelo recém aparado. Sou bom em fingir não dar importância. Era uma tarde de domingo e estávamos sentados embaixo de uma árvore qualquer do parque. Naquele momento eu quis que a árvore caísse em minha cabeça e me enterrasse vivo pra não ver ela partir.

Sei que nunca disse que todas as vezes que a via era um dia feliz. Devia ter dito, não é?

Ah... eu sei.

Nunca fui desses caras românticos que ligam no outro dia ou aparecem sem avisar no trabalho. Nunca levei flores pra uma menina, mas pra ela eu levava meu coração todos os dias.
A gente conversava de tudo, sabe? Música, sexo, livros e horóscopo diário. Era quase uma projeção em miniatura de mim. Eu disse quase.
Sou egoísta. Tenho meus planos solitários que só funcionam solitariamente. Quero viajar pra uma cidade histórica só pra experimentar as comidas, montar uma biblioteca em casa e passar um ano trancafiado lendo histórias que nunca irei viver, transar com uma menina num bar irlandês e fumar um cigarro enquanto ela recupera o fôlego.
Minha meta de vida é viver bem até cinquenta anos e com cinquenta e um casar com a mulher dos meus sonhos e fazer filhos para não morrer velho e sozinho. Se eu não envelhecesse, não iria casar.
Só que ela apareceu. Apareceu com mil sonhos iguais aos meus e controlando meu idealismo babaca. Porra, a gente dá certo em tudo e ela vem me dizer que não damos certo em nada.
Essa mania que as mulheres têm de querer sempre procurar algo novo que possa mudar a vida delas pra melhor, e quando não acham, voltam feito um gato pedindo chamego antes de tirar uma soneca.
Mulher acha tudo fácil. Que é o sexo dominador e podem fazer de qualquer homem o dominado. Pedi arrego.
Quero ver se vai encontrar alguém que faça a comida preferida dela ás 3 da madrugada. Ou que escute seus discos de jazz e ópera que estavam guardados na gaveta á anos. Por ela eu casava com quarenta e nove anos.

Quando eu percebi que é amor?

Veja bem, eu não a amo. Só sinto falta do seu sorriso umas nove vezes ao dia. Acho que não da pra chamar de amor se ela não continuou do meu lado. Não, não me olhe assim. Eu converso muito, adoro conversar, ainda mais quando é sobre essa menina, mas não da pra fantasiar as coisas assim. Desculpa se dei a entender que era amor.
Um dia eu fui embora da vida dela também, sabia? É, rapaz. A nossa história é muito grande e sem sentido algum.
Tava feliz sem ela, e descobri que podia viver assim. Sem mandar duas mensagens ao dia com "Como você ta?" e "Dorme bem". Essas duas mensagens definiam o que eu sentia por ela: Preocupação e carinho. Tem coisa mais bonita do que perguntar como uma pessoa esta e realmente querer saber? Era muito bonito o que eu sentia, mas jurei não sentir nunca mais.
Quando eu fui embora da vida dela, descobri que tudo desandou do lado de lá. Foi quando eu parei de mandar "Dorme bem". Sabia que isso não aconteceria por muito tempo, sabe?
Então eu voltei depois de uns meses e tudo tava diferente.

 Acho que foi assim que eu comecei a gostar dela. Quando ela falou que não iríamos dar certo. Pra um homem como eu, "não dar certo" é o melhor que eu posso ter de uma garota.

Ainda mais quando a gente sabe que isso é só mais uma mentira.



quinta-feira, 14 de junho de 2012

Quando nada mais faz sentido



Pois é, guria, tu tava certa, amor não era pro meu bico. Descobri algo que me encontra com mais facilidade, com mais sorriso. É a tal da paixão, tu se lembra? Te falava que contigo era só amor, nada de impulsividade ou sentimento infantil, só amor.

Tu não era pro meu bico.

No fundo eu nunca fui muito lá apaixonada por ti, sabia? Te encontrava em uma ou duas músicas e fingia que te levaria comigo por onde eu ia, mas nunca foi paixão. E bem sei que sofrer de verdade só acontece no máximo duas vezes. Tu foi minha segunda vez, guria. Sofrer de amor... Sofro mais não.

E me peguei rindo que nem boba, e não era por ti. Que trem engraçado isso de rir que nem boba, né não? Nem bêbada eu consigo ser tão feliz, magina só. E fui muito feliz, guria.

Pensei que as únicas covinhas que iriam existir na minha vida, eram as tuas. Cheguei a pensar que só ficaria sem jeito perto de ti, olha só. Tenho tanto pra viver ainda, guria. Olha que já te disse que tu é que precisa viver, se encontrar e quem sabe voltar devezemsempre. Precisa voltar não, se não for pra dar sorrisos bobos, volta não.

Tinha tantos planos pra gente, guria. Um deles era sempre ir tomar café naquela padaria da esquina antes de ir pro trabalho. É, eu sei, tenho uns planos idiotas, bem sei. Nunca vi amor fazer nada sensato, nem mesmo a gente foi. Deve ser porque era mesmo amor.

Só que tô falando é de paixão. Veja bem, não sei o que é ser feliz, guria. Me ajuda. Tu sempre ia embora e me deixava com vazio no peito, pra mim felicidade é só quando tu volta. Aprendi a moldar minha vida toda pra te esperar. Só que paixão já vem pronto, e não sei como lidar, guria.

Ta vendo só. Até pra seguir em frente com minha vida faço questão de te buscar. Só que veja bem, te busco porque sei que vai embora no outro dia, antes deu acordar. Tu vai me deixar o café pronto como sempre faz, guria?

Tudo bem, vou seguir teu conselho. Vou viver essa paixão enquanto ela existe, e te espero quando teu cheiro sair do meu travesseiro. Combinado, guria?

Prometo que não te lembro á toda hora, se tu me prometer que não vai me esquecer á todo momento.

Isso é amor, guria. Paixão eu sempre posso deixar pra depois.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Trago de você


Hoje eu pensei em fumar, não é de rir? Eu que sempre fui uma certinha, que te julgava quando aparecia cheirando á fumaça - queria fazer o mesmo. Não sei se pretendia sentir seu cheiro na minha boca, ou seu gosto na minha língua ou aquela liberdade que você dizia ter com aquilo entre as mãos. Sei que eu precisava pensar em você com algo mais concreto, te ter em algo real. Mantive a calma, tenho me contido.

Pensei sozinha por um segundo: Existe droga mais forte do que esse amor? - Tenho me drogado de você, e isso está me fazendo adoecer, enfraquecer, endoidecer. Quem sabe me viciando em cigarro consigo ter um vicio que para em minha boca quando eu precisar. Se eu precisar toda hora, compro duas caixas; três. Não tem pra vender de você em qualquer lugar, já procurei e o que encontrei tá guardadinho a noventa chaves dentro de mim. Um livro, uma história, uma canção, um vento no rosto. É tudo que posso ter de você até que me prove o contrário.

Será que o cigarro me mata antes do que meu coração? Será, será, será. Você me invade dizendo que ser amigos é normal, comum. Que não tem por que e pelo quê não conversamos se passamos bons momentos juntos. Eu quero que você me empurre e diga: chega, já cansei de te ver, te ouvir, te beijar, te comer. Porque se você não quer mais isso eu não vou ter esperanças em te olhar, te escutar, te morder e te abusar. Só que não, ignora minhas vontades como se minha presença fosse importante duas vezes ao ano e não quer me perder.

Precisa de mim? Então para de fingir que tudo é passado e que você não tem vontade que eu fique dentro de você, que eu te tenha na minha língua. Eu não sei sumir, não sei afastar, mas eu sei substituir. Enquanto você permanecer longe, com sua licença, eu vou ir comprar um ou dois cigarros.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

É só vontade de lembrar


Fui até o mercado da cidade fazer as compras de sempre, e me esqueci para quê sai de casa. Essas coisas acontecem, não? Esquecer o que ia dizer, esquecer o celular, esquecer.

Retornei pelo mesmo caminho que sempre fiz, com a mesma chinela havaiana suja da terra do meu quintal. Andava meio perdida, mas ainda em mim. Sabe como é, não sabe? Com a cabeça em outro mundo mas sabendo qual o meu lugar. 

Encurtei os passos, abaixei a cabeça e decidi que não iria voltar para casa. Voltar outra vez com as mãos vazias? Havia meses que sempre trazia comigo apenas mãos fechadas e olhar de quem não dormia há dias. Passei no bar da esquina e comprei alguns chicletes - é bom ter algo na boca de vez em quando - mastiguei dois e continuei meu caminho. Me perdi. Não, não me perdi nas ruas ou nos sinais de trânsitos confusos - apesar de sempre acontecer - me perdi no meu pensamento.

"Ora essa, pra quê pensar, guria? Sabe que sempre se inverte e entra em contradição consigo mesma." Falei sozinha outra vez... Mas preciso falar sozinha, ninguém mais quer ouvir. Eu também não tenho mais vontade de dizer. As coisas andam difíceis e quando eu falo soa como uma pobre menina classe média que não sabe o que diz. Não sei mesmo o que eu digo. As vezes nem sei se realmente estou dizendo, parece mais sussurros, respiração falha.

Parei na escadaria da minha casa. Um pequeno sobrado suficiente para morar sozinha com meus dois gatos. Eu gosto de gatos, dizem que pessoas sozinhas gostam de gatos e nunca sei se isso soa como um elogio ou algo ruim. Entendo como um elogio, a solidão é muito desvalorizada. 

Já estava escurecendo e não queria entrar. Eu nunca quero entrar quando preciso. Quando escurece tudo fica perigoso: as ruas, as pessoas, os sentimentos. Dentro de mim parece que abre um feixe de luz, eu gosto das noites, mas gosto principalmente do pôr-do-sol. Mas sempre esqueço de ir para minha janela assistir, é essa mania de esquecer só das coisas que me fazem bem. Eu sempre esqueço tudo, sempre. Como se tivesse um problema na minha programação que me deixa ignorar o que não deve ser ignorado.

Hoje estava na escada, nem tinha me lembrado do pôr-do-sol e lá estava eu: esperando. Acho que uma das coisas surpreendentes de viver é isso: Não saber que esqueceu, até ver que tinha esquecido. Quando eu era pequena ouvia muito: "As coisas acontecem quando tem de acontecer." Depois que envelheci me pergunto se realmente era essa a intenção do destino: não acontecer nada. 

Uma vida boa. Bom trabalho, bons estudos, livros e amantes. Sim, sou uma pessoa sozinha que gosta de ter companhia. Nunca companhia de verdade. Companhia para jantar, companhia para dormir e até mesmo para brigar. Só não gosto de presença. Ter algo presente perto de mim sempre me faz ter vontade de retribuir, e eu sempre esqueço de retribuir. As pessoas reclamam, reclamam muito. Eu gosto de comer e dormir. Acho que por isso gosto tanto de gatos.

Entrei pra casa. Assim mesmo, com os pensamentos á flor da pele, gosto de hortelã na língua e as mãos vazias.

 Queria ver o pôr-do-sol, mas acho que esqueci.

Ah, mas quem sabe amanhã?

segunda-feira, 16 de abril de 2012



Minha vida não é cheia de emoção. Não faço viagens de aventura, sexo com desconhecidos ou saio pelas ruas a noite atrás de drogas. Uma vida comum, para alguém comum. Há quem diga que de pessoas assim não se sai nada que surpreende. Nada que o mundo um dia irá aplaudir de pé.

 Em uma das noites que estava lendo um conto britânico de terror senti alguma coisa passando por mim. Não algo concreto, não deu nem para sentir o cheiro. A única certeza que tinha era dos meus pelos do braço arrepiando em direção  ao teto. Olhei para a janela que havia fechado horas atrás e estava entreaberta.

Engoli o desespero e voltei para a cama. Liguei o abajur da mesa ao lado e no instante que fixo meus olhos na janela, já não estava mais sozinha.

Um homem alto, pálido e com vestes rasgadas estava ao lado do armário. Me olhando com os olhos mais raivosos que já pude encarar. Joguei o maldito livro do outro lado do quarto, jurando a mim mesma que jamais iria ler outra história de terror.

Com passos calmos e sem tirar os olhos do meu rosto sentou-se na cama ao meu lado, pedindo para não ter medo. Eu não tive. Nos primeiros instantes pensei estar com um vampiro, sua pele pálida, seus olhos de uma cor tão diferente e sua aparência de ter vivido a décadas longe da minha geração. O que a gente pensa, nunca é.

Quando perdi o receio de estar na realidade com algo que entra no meu quarto sem ser percebido, perguntei finalmente o que ele queria. Não obtive respostas. Somente sua mão grande e gélida sobre meus dedos e um sorriso que parecia ter esperado séculos para ser entregue. Não sorri de volta, por dentro estava congelada e sem forças para me beliscar e sair de dentro da minha imaginação.

Era como se estivesse dentro de um dos meus contos e estava prestes a ter a cabeça arrancada por uma foice de carrasco e meu sangue escorrendo até o quarto dos meus pais. Aquilo de certa forma me excitou e assustada me levantei subitamente e o homem agora sentado, apenas me acompanhou com o olhar.

"- Eu te procurei por tanto tempo."

Falou deixando aparecer seus dentes brancos e retos. Só quando vi os dentes pude reparar em suas feições. Em seu rosto havia cicatrizes, pequenas, mas visíveis. Quando ouvi sua voz, a sensação que senti foi do som sair de sua boca e entrar pela minha, gelado e fazendo minha barriga se contorcer toda.

Naquele dia eu acordei igual a todo mundo que tem um sonho fora de nexo - sem entender nada. Olhei para o chão e lá estava meu livro, esparramado como se eu não me importasse com suas páginas sem amassados. Nos primeiros instantes pensei que subestimei meu sonho, e na verdade foi um pesadelo que me torturou a ponto de jogar meu livro para longe.

Levantei, me olhei no espelho e havia marcas roxas de dedos no meu pescoço e em meus peitos dentes e chupões. Nunca havia recebido chupões, meu ex-namorado vez ou outra colocava suas mãos em meus seios mas sempre por cima do sutiã. Gostei da ideia de que havia sido estuprada e isso me fez assustar com meu próprio pensamento.

Nunca entendi direito meu sonho e nunca entendi direito porque desde então sempre sonho com ele. Sei que todas as vezes ele diz que vem me procurando a muito tempo, e tenho sonhado com as cenas de sexo todos os dias.

Talvez eu não seja tão normal quanto pensei, mas pelo menos vou para cama cedo todos os dias. 

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Amor é coisa de criança


Hoje quando voltava do trabalho parei para descansar um pouco no parque. Era uma hora bonita do dia, o céu misturava em cores e já não conseguia distinguir o vermelho do laranja. Sentei no primeiro banco que encontrei e ao meu lado estavam dois meninos que aparentavam um desconforto entre si. Descontentes em sua companhia.

Ignorei a tristeza existente ao redor e voltei para admirar as cores que mudavam agora para um tom ainda mais confuso. Quando o sol se pôs por completo senti meu pulmão sugar todo o ar e soltá-lo com um alívio distante de mim.

A semana havia sido difícil, e finalmente surgiu tempo para organizar meus pensamentos e ideias. Evitava falar de sentimentos e sobre o que me constituiu ao decorrer da vida. Não é fácil amar nos tempos de hoje, e sabia disso. Sinto que perdi muito tempo olhando fixamente para uma estrela que antes me pareceu um avião. Sei que sem notar, um dos meninos se sentou ao meu lado e me olhou fixamente. Antes que pudesse pronunciar qualquer surpresa, o menino de cabelos pretos e enrolados voltou o rosto, olhou para a mesma estrela e disse:

- É verdade que não existe o amor? - suspirou - Meu amigo disse que é conto de fadas e não senti mais vontade de conversar com ele. Foi embora bravo e fiquei aqui sozinho. Percebi que olhava para o céu e pensei que também estivesse triste, e quando não é por amor que as pessoas ficam triste é por dinheiro. Você está triste por dinheiro?

Soltei um riso diante da inocência de uma criança em sair de seu banco e ir conversar com uma estranha. O menino não parecia ser pobre, pelo contrário, usava bom tênis, camisa de marca e óculos de grau que devem me custar um mês de trabalho. Vendo que hesitei em responder, me olhou novamente e sorriu.

- Você não tem cara que sofre por dinheiro. Mas sabe, minha mãe diz que dinheiro não compra felicidade, e meu pai diz que dinheiro só não compra amor. Fui contar isso para o Pedro, meu amigo que estava aqui, e ele me falou que seus pais diziam se amar, mas hoje o pai dele mora com uma moça em outra cidade e que amor é pra pessoas idiotas. Você também acha isso?

Soltei um sorriso entre dentes e falei:

- Se amor fosse para idiotas, grandes referências como Chico Buarque, Cazuza e Elis Regina não falariam sobre ele. Creio que amor é para quem acredita, não?

- Não sei quem são esses, mas você tem cara que sabe das coisas. Aliás, todo adulto tem. Queria ser grande logo, para mostrar que sei das coisas. - mexeu em uma folha seca jogada no banco e continuou - Todo dia dou meu lanche para uma menina da minha escola, e fico sem comer. Não faria isso por mais nenhuma outra, isso é amor? 

- Se gosta de ter ela por perto, e fica feliz quando a vê feliz com seu lanche, é uma das qualidades do amor. Não precisa ser padronizado, entende? Tem casal que se ama muito, mas se separam às vezes por motivos que o amor não pode interferir, pode ser o caso dos pais do seu amigo.

- É. Você fala difícil, mas eu consigo entender. Meu pai é advogado e vive dizendo que amor não existe nos contratos de divórcio, não da para dividir em separação de bens e calcular perdas e danos por isso. "O amor é um estrago que já vem sem reembolso." Quando solta essa frase, não entendo bem, só que sempre o observo rindo de lado e bobo para minha mãe, então entendo que não é possível colocar sorrisos bobos no papel e pedir dinheiro em troca.

- Algumas pessoas mantém o privilégio de fazer o amor durar pela vida inteira. É para poucos.

- Só não entendo o porquê de você ser tão calada. Meus pais dizem que converso muito, e converso mais nos dias em que a menina da minha sala, a que dou o lanche, pede algum material emprestado. Fico sorrindo para ela do modo que meu pai sorri para minha mãe, e torço para me devolver o material após a aula, assim podemos ir até o pátio para conversar. Ela é linda, sabia? Não conseguia diferenciar bonito do feio, então vi que ela tinha uma mecha do cabelo torta e achei aquilo engraçado, mas um engraçado de querer ter sempre aquilo por perto para mim. Soa estranho? 

Comecei a rir diante do menino que não parava de contar histórias. Falava, perguntava, e no fundo, meu desejo era soltar de uma vez que amor era algo que não existia mais, extinto como os dinossauros. 
Só que tudo fazia muito sentido, ficava olhando ele dizer como se fosse uma pequena miniatura de mim. Passamos horas conversando enquanto seus pais faziam compras no shopping. Apresentei meus poetas preferidos e músicas mais tocadas. Não quis contar que por amor há dias em que a gente sofre, perde o coração e não consegue de volta. Esses detalhes o tempo nos faz descobrir sozinhos. Também não quis contar que a menina da escola era só uma paixão, afinal, nunca se sabe.


Sei que voltei para casa com um brilho diferente naquela noite, como se a estrela que olhei por tanto tempo tivesse voltado comigo.

Não cheguei a dizer para ele... Mas sabe de uma coisa?

Ainda bem que o amor existe.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

De todas as melhores coisas


Você sempre me disse que eu colocava sentimento demais nos meus textos e deveria deixar as coisas mais subtendidas. Talvez por ser tão minha amiga e não querer que meu lado mais fraco fique sempre a mostra. O problema é que nunca consegui deixar de escrever tudo o que pensava e mesmo assim você nunca deixou de ler e pensar que talvez do meu jeito errado as coisas estivessem certas.

O problema é que você sempre foi minha solução. Nossa relação nunca foi muito normal. Há quem ache que fomos namoradas e só assim eles explicam nossa amizade com laços tão fortes e quem fale que eu nunca fui boa influência e você com seu jeito de princesa só era corrompida por minhas impulsividades de matar aula, chorar com desenho ou até mesmo reprovar de ano.

A verdade é que eu sou uma desajeitada que se deu muito bem com seu jeito de organizar as coisas. Eu falo muito sobre amor, mas acho que nunca te falei que você é meu maior amor.

Você sempre foi meu lado oposto. Um repouso que uma encontra na outra nos momentos de choque da vida. Você já foi embora da minha vida, disse que me odiava, que meu signo era uma merda e nossa amizade é uma das melhores coisas da nossa vida.
A gente sempre levou uma vida muito do nosso jeito. Se tava ruim pra uma - a outra organizava. Foram anos analisando o que uma dizia por olhar e conversando por sorrisos em um lugar lotado de pessoas querendo descobrir do que estávamos dando risada.

A vida pra gente nunca foi muito fácil, só que também não foi nada impossível. Se for fácil, eu não quero; se você for, eu vou junto. Sempre foi assim.

E estamos indo juntas há não sei quantas vidas. Lembro até hoje quando eu entrei naquela escola com cara de poucos amigos e sai de lá com o sorriso escancarado de que sem dúvida não iriamos desgrudar nunca mais.

Dizer que você é minha irmã é quase um clichê mal inventado. É quase uma mãe, parte de mim incondicionalmente. Odiar uma mãe é quase uma blasfêmia, e é o que eu sinto quando penso em sentir raiva de você.
Porra, temos defeitos pra caralho. Você odeia minha falta de calma nas coisas e eu odeio sua falta de senso emocional. Sei que acha graça do meu inglês mal estudado e eu acho graça quando diz que ta gorda só porque aumentou dois números de calça. Te acho feia quando ta linda e você diz que eu to fedendo quando acabei de passar meu perfume preferido.

Você é minha desculpa para não ter que sair quando não quero, afinal, eu odeio sair. Vou te colocando na minha vida como se você fosse ficar pra sempre, e eu sei que vai.
As pessoas mudam e mudam demais. Você mudou tanto nos últimos anos que tenho que voltar na minha gaveta empoeirada para lembrar como era antigamente. Só que no meio de tanta coisa mudando, tanta coisa indo embora, tanta coisa ferrando nossa cabeça, eu sei que no final passamos despercebidas no meio dessa confusão toda.

E eu realmente não sei como viveria hoje sem nossos acessos de amizade repentina. Nosso jeito de ir levando a personalidade da outra no peito, de rir quando nada ta certo mas sabemos que temos alguém pra comprar chocolate e reclamar da vida no fim do dia.

Volto a dizer que no meio de tanta coisa errada, você é a mais certa. Tudo bem que as vezes você tem lá seus acessos de ciúme, fica de cara fechada, diz que eu não posso me apegar amigavelmente com mais ninguém e que preciso parar de ser fofa com as pessoas. Só que nossa vida é muito nossa pra deixar alguém mais se aprofundar nela.
Me atrevo a comparar amigos com aparelhos eletrônicos, sempre precisamos de vários e são essenciais para nossa vida. Tem amigos música, amigos internet, amigos mensagem e amigos telefone. E quando eu penso assim, que cada amigo é uma função e são todos importantes demais nesse novo mundo em que vivemos, cheio de coisa fodendo o sistema... Você é um Iphone que encontrei perdido no meio da rua.

Essa é a hora que você me olha com cara de que não tem ideia do que estou falando mas que no fundo entendeu muito bem minha viagem. Meu jeito de andar nas nuvens com teu jeito de firmar os pés no chão. Você fala sobre Freud e eu falo sobre Pikachu. Você me diz que quer assistir um romance e eu te levo um filme de terror. Acaba você me mandando fazer comida e indo dormir.

Você é minha melhor amiga. E hoje eu posso dizer isso sem medo dos rótulos. Porque eu sei que quando chegar a hora de todo mundo partir, até mesmo você, é você quem volta. E eu vou te apresentar pros meus novos amigos como se eles nunca pudessem ser como você. E eles que vão ficar com ciúmes, e vai ser o pior ciúme que existe. Afinal, eu tenho o maior amor do mundo.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Faça silêncio, meu amor dorme aqui


Aprendi a lidar com silêncios. Não é uma coisa de que me orgulho, mas passei até a gostar do silêncio do outro lado da porta, do outro lado do telefone. Me incomodava no começo, não sabia onde colocar todas minhas letras no espaço vazio que me rodeava e por ventura, sempre acabava colocando no lugar falso. Percebi que não se pode brincar de falar as coisas na hora errada e logo depois vi que a hora certa não chegaria.
Fui me virando. Um café aqui, menos vodca ali, menos olhadas para a lua e mais noites de fuga em filmes alienados. Esquecer é parte do que não vai fazer mais parte de nós.
Meu lugar é fora de mim. Já não consigo mais acreditar que um dia me livrarei desse vício de viver no passado, sendo que minha maior vontade é estar lá e dizer que realmente não da para se viver no vazio.
Eu vivo no vazio por falta de opção, eu tenho várias escolhas mas escolho a que me faz mais feliz. Tem quem dirá que ser feliz não é viver com o coração estufado de ausência, de amor que não é ao menos lembrado. Abaixo a cabeça e concordo fielmente á cada sermão que recebo para ser alguém melhor. A verdade é que não sei mais o que é felicidade, o que é rir sem sentir que quer vomitar. Só que se for para viver onde não posso lembrar que essa ausência hoje já foi muito melhor que a felicidade que me propõem, eu não sei nem ao menos se quero ser feliz.

Acho que convivi tempo demais com o silêncio. Melhor deixar ele falar por mim.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Espantalho de aço



Cansei. Cansei de bancar a inabalável e chegar todo dia em casa com o peito estourado. Como se livra disso, alguém pode me dizer? Alguém ao menos já sentiu coisa parecida?
Já não basta ter o coração remendado tenho que conviver com o medo de bancar a idiota para sempre. Não faça isso, não diga aquilo, não procure por isso. Tudo bem, sou um robô dessa sociedade com o peito de aço. Um robô que por dentro é espantalho, boneco de palha e para surpresa de metade das pessoas que se movem com ajuda de parafusos e chaves de fenda, eu não me importo.
Se para vocês orgulhosos e independentes a resposta para tudo é ignorar, pois ignorem. Me faça de cachorra que eu imito o dono. Quer me comer no quarto escondida e limpar as evidências para parecer dona de si, faça isso, o orgasmo é meu, a consciência é sua.
Vai, anda na rua como se nada tivesse acontecido. Frequente suas aulas como se nem tivesse me conhecido. A vida de mentira é fácil de levar, fácil de enganar os idiotas que te olham com cara de desprezo com um sorriso falso e nem percebem. Eu levo uma vida de saudade, tão difícil que meus amigos me perguntam se estou com fome toda hora, e eu digo que sim. Comer alivia, libera o vazio.
Só que não, não aguento essa hipocrisia que gira ao redor do mundo dizendo que o mais fácil é fazer uma cesariana no peito e arrancar á força. "Já passou da hora, já é hora de sair." Não, não é. Sou o criador da coisa mais bonita que já apareceu e não vou tirar de mim e jogar fora, dizer que é um feto mal gerado.
Foi feito com amor, cuidado e tempo. Um tempo tão grande que nem esse fascismo ideológico arrancaria minhas crenças e dedicação.
Pare de bancar a tola fingindo que paz é eu não estar perto, paz é eu não te encher de perguntas e carinhos aleatórios no dia. Para de bancar um soldadinho de chumbo com o coração mal projetado. Eu quero sair dessa onda de falsas esperanças que as pessoas vivem e viver um pouco de verdade pra variar.
O que falta no mundo não é paz, é um pouco de bom senso pra fazer as coisas certas. Se costuma pensar o contrário, talvez esteja só andando com os robôs errados.

sexta-feira, 9 de março de 2012

O amor é de outro mundo


 Ontem conheci alguém que não vale a pena. Digo, não foi ontem, mas está no passado então prefiro um passado mais próximo do que um carregado de dias perdidos. Continuando, ontem conheci alguém que não vale a pena. Meus amigos, primos, dupla personalidade e cachorro falaram que ela não valia a pena. Então deve ser verdade, não? Eu sabia que quando um amigo diz "Não assiste esse filme, não vale a pena.", era verdade. Nunca assisti um filme, ou li um livro quando me falaram que eu seria decepcionada.
Mas a pessoa se fez valer. Ela é um daqueles extra terrestres que fazem a gente beber o café da segunda xícara e ainda chamamos o garçom para outra rodada. Alcoolizados com cafeina e bêbados de ilusão. Você nem gostava tanto de café, e se descobre um viciado patético pelas duas novidades que embrulham o seu estômago. Tudo se mostra questão de tempo, tempo para entrar naquela perda de tempo e tempo para tentar sair do tempo perdido. Durante aquele temporário, é flores.
E você que nem se considerava poeta se pega dizendo aos seus amigos que valer a pena é questão de fazer acontecer e todos os textos e músicas fazem um sentido absurdo.
Então o mundo desmorona.
Ontem eu conheci alguém que não valia a pena e mesmo descobrindo um dia depois, meu coração explodiu. Explodiu feito uma bomba atômica, deixando qualquer coisa bonita, finda e sorridente, irreconhecível.
Fui tomar o café de sempre, aquele mesmo que ontem tomei enquanto soltava felicidade entre dentes. O café estava frio. Fui passear pelo parque olhando os cachorros correndo atrás de seus discos. Não tinha nenhum cachorro.
Extra terrestre é uma coisa difícil de aceitar. Fazem a gente acreditar em magia, dizer para todo mundo e quando nos acostumamos: Lá vão eles no seu disco voador, atrás de algo que quem sabe para eles... possa valer a pena.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Saudade por correio


Teve uma época em que eu sabia que era feliz. Não era uma época de muitos sorrisos, mas eu era feliz.
Quando era dia de sorrir, me perfumava e usava meu melhor tênis. Quantos dias de sorrir voltei para casa chorando. Só que ainda não era amor.
Então, quando era dia de amar eu dizia e escutava as melhores palavras do mundo e isso valia a pena por semanas. Se afastar era só pra ter certeza que o outro sempre volta.
Um dia o outro não voltou. Quando tudo se inverteu e os dias de sorriso viraram dias de mentira, eu quis gritar com o tempo. Só que não podia. Menti tanto para os outros, tanto para mim, que o tempo me mandou ser forte e aguentar.
Eu não aguentei. Todos os dias me perguntava se a saudade não podia ir buscar de volta e ela nunca voltava. Fiz da saudade meu pombo correio e passei a cria-lo como bicho de estimação. Depois de anos, meu pombo correio morreu. A saudade morreu. Pensei que em outro lugar alguém mandaria a saudade vir me buscar, mas já não acreditava mais em fantasias.
Lembrei de um dos meus escritores favoritos onde diz "Onde andará? É das perguntas mais tristes que conheço, sinônimo de se perdeu." Eu não sabia tampouco onde eu andava, imagine ela.

É triste viver meus dias banhada na esperança de sentir algo novamente. Passaram tão poucos anos e vivo como se tivesse respirado décadas de mofo nos pulmões.

 "Larga de drama." seria o que ela me diria agora. Quem sabe eu não deveria largar. Largar o drama, largar você e me largar. Até sua saudade enfim me responder que  nunca foi drama, sempre foi só amor.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Greve de espaço


Hoje foi o dia que passou.
Todos viviam sussurrando entre dentes e suspiros: "Vai passar, um dia vai passar."
Eu como boa amante da ilusão dizia que não passaria nunca ou até eu dar meu último sorriso mesmo que em vão. No fundo, eu sofria justamente para não passar.
Então decidi parar de sofrer, experimentar como é ser livre e dona do próprio caminho como essas pessoas que dizem com tanta certeza que tudo passa.
Fechei os olhos, puxei tudo para fora e dei de cara com a saudade. Penso eu que quando a saudade é grande demais se transforma na pessoa. Saudade pra quê? Retruquei em pensamento. Então a saudade foi embora.
Quando ela foi embora saiu o desespero. Saiu tão depressa atrás da saudade que não me lembro de como ele era.
Na fila estava a raiva, dizendo que nunca viu menina mais tola que eu e já não era sem tempo de se despedir. 
Foi quando achei que tudo que me fazia sofrer tinha saído, me sai o orgulho. Dizendo que eu nunca o feri tanto como nos últimos anos e que não voltaria jamais. 
Atrás do orgulho foi correndo o amor. Quando o amor saiu me calei. Ele me olhou, eu olhei para ele e nos tornamos desconhecidos. 

Só depois de algumas horas pude ver que não notei que junto deles havia ido meu sorriso. Como pode alguém sorrir sem ter o que sentir? 
Então passou. Passou tão rápido que o tempo não sabe mais contar.
E quer saber? 
Seria mais bonito se não tivesse passado. 

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Baseado em fatos irreais

Estava me machucando, então eu pedi para parar. Quando eu falo é uma ordem. Não quero perguntas e nem argumentos contrários, só quero que me obedeçam. Fui criada assim, mimada e com princípios abusivos. Sei que não estou sempre certa mas eu faço o possível para acreditarem que sim. Até que começou a me machucar. Pedi para parar e não parou. Gritei, esperneei, falei que iria me jogar do primeiro prédio de quarenta andares que encontrasse. Nada.
Senti pela primeira vez na vida que não podia controlar alguma coisa. Minha primeira reação foi esperar. Quem poderia ir contra minha palavra e sair ileso?
Esperei tempo demais. Quando me dei conta precisei amputar metade de mim. Mesmo assim ainda se parecia comigo. Cheio de marra e idealismo. Um nazista dos meus sentimentos.
Resolvi usar a outra metade que me restou para recuperar quem havia ido embora. Dessa vez não iria esperar, iria atrás, iria lutar e mostrar que deveria ter parado de me machucar e ficado desde o princípio ao meu lado.
"Viu, você devia ter me ouvido desde o começo." É o que eu iria dizer. Sim, ia ser exatamente o que ia dizer quando ela voltasse. Passei o mesmo tempo de espera, lutando. Perdi primeiro a batalha, depois a guerra e no fim, cai no chão e perdi a metade de mim.
Hoje sou uma cópia, devendo todos os sonhos do universo para aquela menina que jurava ter o mundo nas mãos. Busco da melhor forma pagar as dívidas de um coração partido. Hoje comprei remédio, ontem tinha comprado três barras de chocolate, mas a pergunta é:
- Onde compra amor?
 (...) Nunca descobri.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Amar sem ponto final

Era amor. Repito mil horas depois que era amor. Não era esse amor certinho de filmes e colegial. Era como um vulcão que explodia, queimava tudo e no final deixou só pedra. Podia ser difícil, mas ainda era amor. Digamos que eu não fui a pessoa mais certa do mundo, mas eu sabia amar direito. Do meu jeito meio torto e cheio de dúvidas, afinal, que mulher não tem dúvida? O mais engraçado é que não nunca exigi troca. A única troca que eu me permitia era de olhares. Incerteza é afrodisíaco para quem gosta de desafio.
Deixa no ar, deixa perceber pelo sorriso, pelo carinho.
Quem percebe o que não tem importância? Ninguém.
Era amor pois para ser amor precisa de dois. Precisa de coragem, precisa de desespero pelo colo do outro em dias de chuva. Tem gente que deixa passar o amor só para dizer "Ah, não era amor."
Eu deixei passar. Deixei passar anos, sentimentos, feriados, filmes no cinema e mesmo assim... ainda é amor. 

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Via de coração duplo

Cheguei em casa como quem chega ao céu. Joguei minha bolsa em qualquer canto da sala e os livros pelo caminho do quarto. Era tanto cansaço que não sabia mais se era físico ou emocional, só precisava não estar ali. Não queria pensar nos problemas, mas os problemas viviam para mim e eu costumo ser uma pessoa responsável. Mas não naquele dia.
Tirei meus sapatos apertados, desabotoei o short e amarrei meu cabelo. Pensei em ligar, mas quando coloquei a mão no celular havia uma ausência. Sempre tinha uma mensagem ou ligação perdida, pois minha rotina nunca deixava perceber uma ligação. Naquele dia só ausência.
Me deixei ser ausente também. Joguei o aparelho no sofá e fui até a cozinha. Me empanturrei de comida: doces, massas, frituras, refrigerante. "Não era fome." Pensei.
Como é que só percebemos que o vazio não é fome, depois de tanto comer? Pensei em voz alta enquanto ligava a TV e passava os canais com a cabeça em outro mundo. Desliguei. Por um momento relutei em me desligar, mas lembrei que o botão estava estragado. "Amanhã eu mando arrumar." Nunca mandei.
Sai horas depois para dar uma volta no parque frio e sem movimento. Havia um carrinho de pipocas parado ao lado do banco mais próximo do lago. O cheiro me lembrava o gosto de sua boca quando íamos ao cinema. Comprei e joguei toda a pipoca para os pombos. "É aí que você deve ficar. No chão e na boca de aves." Dei um pequeno sorriso mas nada que me deixou mais alegre.
Voltei para casa e me atirei na cama, com roupa e tudo. Enfiei a cabeça entre os travesseiros e me permiti chorar. Chorar até sufocar com a saliva, até bufar de incapacidade de mudar a vida, até não sentir mais você.

Acordei no outro dia bem mais feliz e com fome, e hoje já não derramo uma lágrima ou pipoca que seja por você.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

O colecionador de amores



Ser adulto é um pouco como ser criança. Joga no amor como se fosse uma brincadeira de pátio no primário. Ganha um álbum de figurinhas que ninguém tem, e logo o colega quer ter um igual. Quando se dá conta, todo o colégio está contaminado pela febre de quem completa o álbum primeiro. Quem será feliz primeiro?

Gasta dinheiro, tempo e paciência para completar cada espaço vazio do peito, ou da página que falta a figurinha número 34. Quase uma chave do coração. Compra vários pacotinhos na revistaria da esquina, aquela onde tem o sorveteiro que vende o picolé de groselha mais gostoso da cidade, ou compra flores, onde todo dia às 18:05 aparece os olhos mais aguardados do dia.

Criança também se decepciona, consegue quebrar a cara. Rasga com tanta vontade o embrulho de sua felicidade e para sua surpresa: Já tem mil figurinhas daquela espalhadas pelo quarto, janela e carro dos pais. Não da pra esconder uma decepção de criança.

Adulto esconde. Acredita que a menina que trabalha ao seu lado tem o sorriso mais belo da cidade, e é pra isso que ele sai todo dia de sua casa para encarar a rotina. Mas continua saindo com aquela à quem não se gosta, não se pertence. Ser grande é aprender a colecionar a figurinha repetida, não da pra completar álbum, isso é coisa de vagabundo. Então nem compra mais. Só tem isso? Então me contento com o que tem. Não da pra ser feliz só se contentando, mas os adultos não sabem disso.

Um dia por querer, um colega da escola joga a figurinha número 34 no chão, meio rasgada, velha e faltando cola. "Já não serve para nada." O menino corre, fica com medo que alguém veja e sorri segurando a figurinha apertada entre os dedos. Volta o mais rápido que pode e abre o álbum e seu estojo com sua cola bastão. É o dia mais feliz de sua vida e não precisou sequer ir à banca se sujar de picolé para ter isso. Simplesmente aconteceu.

Aquela figurinha. Do seu  Pokémon preferido, time de futebol ou banda, não importa. Ele não precisa completar o álbum, as outras crianças correm para trocar suas figurinhas e gastar o dinheiro dos adultos nas bancas. Sempre tem a criança que não completa o álbum, e não é porque ele se contenta como os adultos. A felicidade chega quando acha a melhor figurinha do álbum, mesmo que todos naquele lugar a joguem no lixo.

Mas é que sempre tem alguém, por mais adulto ou criança que seja, que sabe que não se brinca com o amor... ou com um álbum de figurinhas. 

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Outro dia

Foi então que ela partiu.

Partiu sem saber que estava partindo, e quando soube não se importou com nosso fim invisível. Temia que ela voltasse e bagunçasse tudo o que construí em sua partida: meus amores, minha carreira, meus estudos e cartas empoeiradas no fim da última gaveta. Ela teria bagunçado alguns anos atrás, mas não desta vez. Desta vez a realidade se fez de durona e calou meus sonhos de amor adolescente. Meu assombro se tornou sua ausência. O medo dela voltar e transtornar minha vida foi usurpado pelo desespero de nunca mais poder estar ao seu redor.

Nunca mais estive.

Quando ela chora, ainda sinto suas lágrimas no meu ombro. Não sei nada de sua vida, mas quando sinto meu coração apertar sei que é de temer que ela já não exista. Mesmo que distante de mim, minha vida em um lugar que ela não respire seria a própria morte. Penso nela todos os dias, mesmo sabendo que para ela os dias não contém um rastro meu. 

Tento fazer ela voltar.

Mas a memória dela é frágil e se esqueceu que ao menos já esteve aqui. O final é triste pois não haveria felicidade em tanta espera e amor. Meu amor por ela é doce e voraz. Sonho todos os dias acordada, querendo sentir seu perfume em minha pele e seu corpo em minha cama. Planejo ter ela viva em carne e osso, e me contento com uma foto amassada e envelhecida. Eu era uma pessoa feliz, com ela e por ela. Depois que partiu eu sou apenas um fantasma perambulando pela cidade esperando ela me sorrir e dizer que finalmente vai ficar. 

Ela nunca ficou antes.

E no fundo sei que nunca vai ficar, mas isso não me impede de ainda querer sonhar.